sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

TOY STORY 3, de Lee Unkrich



Capítulo 1 – Toy Story 3 e o subliminar eterno retorno

1.3 – O porta-voz do círculo
Da alegre existência, enquanto na companhia de Andy, à triste monotonia solitária no baú. Do ensolarado e aconchegante quarto de Andy ao úmido e escuro sótão. Da previsibilidade enérgica da infância à inesperada mutação da adolescência. Do terno e inesquecível primeiro encontro à desditosa e derradeira despedida...

É assim que o roteiro de Toy Story 3, brilhantemente escrito pelo oscarizado Michael Ardnt, apresenta-nos a teoria mais aterradora do filósofo Friedrich Nietzsche (1844-1900) – o eterno retorno.

Nietzsche considerava sua visão de o eterno retorno como seu pensamento mais profundo e aterrador e, ao mesmo tempo, mais assustador. O eterno retorno teria assaltado sua mente durante uma caminhada em 1881, ao contemplar uma formação rochosa. Durante esse passeio, Nietzsche refletiu sobre os sentidos das vivências em alternâncias que se repetem.

“Para os que pensam como nós, as próprias coisas dançam: vêm e estendem-se a mão e riem e fogem – e voltam.
(...)
Em cada instante começa o ser; em torno de todo ‘aqui’ rola a bola ‘acolá’. O centro está em toda parte. Curvo é o caminho da eternidade.”


O eterno retorno nietzscheano alude aos ciclos repetitivos da existência e suas dicotomias que se completam, como felicidade e dor, prazer e ojeriza, guerra e paz, caos e ordem.

Criação, destruição e criação se sucedem no curso da vida. Mas não se trata de um ciclo cronologicamente determinado. Tudo oscila e se sucede a cada instante, de modo que os pares aparentemente – mas não realmente – antagônicos se misturam e se completam.

Como a realidade não tem objetivo, ou finalidade (pois se tivesse já a teria alcançado), a alternância nunca finda. Ou seja, considerando-se o tempo infinito e as combinações de forças em conflito que formam cada instante finito, em algum momento futuro tudo se repetirá infinitas vezes. Assim, vemos sempre os mesmos fatos retornarem indefinidamente.

Sunnyside: o eterno retorno em tijolo e cimento.

Por isso mesmo, Sunnyside – a creche –, além de amarrar os pontos da história, representa simbolicamente a materialização do eterno retorno. Há ali, um espaço reservado a fotografias que comprovam a passagem de várias gerações. Não seria, afinal, a eterna repetição de um mesmo ciclo?

Os céus de Toy Story: alegoria do eterno retorno.

A própria fotografia que abre o epílogo e que termina o filme – a de um lindo céu azul repleto de nuvens brancas –, também ajuda a conceber e reforçar a história como um ciclo repetitivo: começo, fim, (re) começo...

Aí reside a dificuldade em apreender o aterrador conceito do eterno retorno, pois tal conceito leva a várias indagações: Amamos ou não amamos a vida? Se tudo retorna, isso seria um dom divino ou uma maldição? Amamos a vida a tal ponto de a querermos, mesmo que tivéssemos de vivê-la infinitas vezes? Sofrendo e gozando da mesma forma e com a mesma intensidade? Seríamos capazes de amar a vida que temos – a única vida que temos – a ponto de querer vivê-la tal e qual como ela é, sem a menor alteração, ao longo da eternidade? Temos tal amor ao nosso destino? Eis a grande indagação que é o Amor fati (Amor ao Destino) contido em o eterno retorno.

Cena de rito de passagem em Toy Story 3: Amor fati no cinema.

A visão nietzscheana de “amar ao destino” pretende fazer uma afirmação da vida, das circunstâncias, daquilo que somos. E, em Toy Story 3, Woody, para quem o sofrimento não representa uma objeção contra a vida, aprende a “amar ao destino” quando observa a hesitação seguida de aceitação (amor fati) por parte da mãe de Andy quanto ao rito de passagem do seu filho – a ida para a faculdade.

É por conta do amor fati que Woody garantirá uma bela surpresa à platéia. Confiram!

P.S.:
Com a chegada de outro ano (novo?) e, agora, com o conhecimento do assustador eterno retorno, o DC, que não se exime do seu dever, deseja a todos os amigos: Amor fati em 2011!
Mas também não critica, e confessa preferir o velho “FELIZ ANO-NOVO!”. Então, tá...
FELIZ 2011 galera! Que ele seja repleto de grandes filmes para todos nós. Amém!

4 comentários:

  1. Valeu pela participação lá no Película Criativa.

    Sempre que puder vou passar por aqui também.
    Feliz Ano Novo!

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  2. Feliz Ano Novo! "Toy Story 3" é um lindo filme. Acho uma obra que faz um fechamento perfeito e ainda mostra que o fim não é necessariamente um término. Ele pode ser um recomeço!

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  3. Hahaha, feliz 2011, meu caro Cassio!
    E achei fantástica a sua análise nietzschana acerca de "Toy Story 3", pra mim, a obra-prima de 2011 - publiquei ontem uma review dele lá no blog.

    Eu não conhecia a teoria o "eterno retorno" e wow, realmente assustador rs. A trilogia inteira, todos começam com o céu ensolarado, desde o primeiro capítulo. Lendo o seu texto e recordando as minhas aulas de filosofia do meu Ensino Médio (hehe), remeti "Toy Story 3" também a Foucault e toda aquela parada do "vigiar e punir", o conceito da hierarquia sem libertação, o panóptico, que tudo vê - no filme, o macaco que bate os pratos. Enfim, acho que dá uma boa contextualização. Como eu sei sobre o assunto bem superficialmente, seria legal ver um texto seu a respeito, hã?

    Grande abraço!

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  4. Película Criativa: Quê isso?! Eu que agradeço a existência de teu espaço. Sinta-se em casa. Feliz 2011 pra ti também! Abs

    Kamila: Feliz 2011 minha querida! Dissestes tudo. Abs

    Elton Telles:Vlw. Feliz 2011 pra ti tb! Muito obrigado pelo elogio! Também considero Toy Story 3 um grande filme (só não o digo o melhor de 2010, porque ainda tenho alguns pendentes). rsrsrsrs Ah...podes deixar que passo já, já, lá. Fiquei curioso para ler tua crítica.
    Sinto muito por ter te apresentado o eterno retorno! rsrsrsrs O céu ensolarado, pois é, curioso não?
    Hum...Foucault! Podes deixar. Mais uma vez, obrigado pela confiança. Grande abraço, brother.

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